Como já sabemos, até mais ou menos o final da Idade Média, a maioria das civilizações sacrificava as crianças com deficiência à morte, sempre em conformidade com os mais diversos costumes, crenças, etc.
Após a Idade Média vários adventos econômicos, científicos e sociais contribuíram para que os direitos humanos embrionários pudessem fazer parte das discussões que permeiaram os movimentos acadêmicos-literários-culturais.
A partir daí, as questões relativas às fragilidades humanas passaram a comover grupos sociais em surgimento de acordo com a ebulição evolutiva das atividades do Homem moderno, em busca das melhorias fundamentais para a implantação do bem-estar coletivo.
A fraternidade francesa, por volta da metade do século XVIII, contribuiu para a inserção dos cegos na Educação. Depois das grandes Guerras Mundiais, os soldados americanos, lesionados em ação e, por isso, excluídos dos benefícios do progresso social, resolveram cobrar do Estado americano, as devidas providências para mostrar que os seus sacrifícios não foram em vão.
Na medida em que os filhos da América se mobilizaram para exigir os benefícios sociais compensatórios, que lhes garantissem o retorno ao convívio social, o mundo começou a estar mais atento às questões relativas às pessoas com deficiência, durante o século XX.
Vale salientar, algumas convenções importantíssimas da OIT, partindo do final dos anos cinquenta que trouxeram determinações extremamente avançadas para a época, no que diz respeito às garantias de promoção e proteção dos direitos das pessoas com deficiência no mercado de trabalho e emprego.
No Brasil nossa Constituição Federal de 1988 estabeleceu uma importante linha demarcatória. Primeiramente ao reconhecer que a equidade é política de Estado, assumindo que ela só existirá de fato, se respeitados os direitos das minorias. Em segundo lugar ao assumir o conceito de democracia participativa e co-gestão paritária de políticas públicas sociais. Dali para frente o direito das pessoas com deficiência estarem presentes diretamente na produção, controle e avaliação das políticas públicas estava assegurado.
Contudo, apenas no início dos anos noventa, aconteceu a sanção da Lei 7.853/1991, que, além de trazer uma excelente literatura jurídica a respeito dos direitos das pessoas com deficiência em todos os aspectos, criou a Coordenadoria Nacional para a Integração das Pessoas com Deficiência (CORDE), órgão coordenador transversal das execuções interministeriais das políticas públicas para as pessoas com deficiência no Brasil.
Desde então, legislativamente falando, o entusiasmo não parou e o Brasil deu saltos gigantescos, tanto no número quanto na qualidade das Leis compensatórias para beneficiar as pessoas com deficiência. Leis como a 8.213, a 10.048, a 10.098, o Decreto presidencial 5.296/2004, a adoção da Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência da ONU e outras.
Hoje, o nosso país tem, provavelmente, a legislação mais evoluída do mundo no que se refete às questões relativas às pessoas com deficiência. Entretanto, ainda há que se transpôr barreiras enormes para fazer com que estas leis fantásticas virem realidade pois, não é segredo nenhum, a dificuldade extrema que as nossas autoridades têm para cumprir a legislação, da qual todos eles se dizem signatários de primeira hora.
A nós, parece que isso ocorre, também, por uma fiscalização precária dos poderes competentes.
Não se deve nem se pode deixar de mencionar os exemplos de experiências de sucesso nas capitais das regiões Sul e Sudeste do Brasil onde, frequentes tentativas de igualdade em oportunidades e adequação de condições para que as pessoas com deficiência tenham um padrão satisfatório de desempenho social, tem sido um fato constante, não só quando se fala em assessibilidade como também, no que diz respeito a trabalho, transporte, educação, esporte, lazer e cultura.
Agora, concluindo, não dá para esconder o oportunismo de plantão que impulsiona a voracidade irrevogável dos nossos "burros motivados" travestidos de parlamentares para garantirem os votos necessários para a próxima eleição, afinal defender pessoas com deficiência pode dar destaque na mídia.
No Distrito Federal, uma Lei de 2008 prevê, entre outras coisas, que a rede bancária local forneça estrato em Braille para deficientes visuais. Como o autor da lei não conhece a operacionalização da concessão do benefício e muito menos o fato do assunto ser competência do poder executivo federal, quis obrigar a todos os bancos a garantir o serviço em todas as agências bancárias, na hora em que os supostos respectivos beneficiários solicitassem o estrato em braille através dos caixas eletrônicos.
Mais recentemente, outra deputada do DF, ao ouvir falar na necessidade da construção de um prédio para abrigar o Centro de Ensino Especial para deficientes visuais da capital do país, procurou logo garantir uma “generosa” emenda parlamentar supostamente, com este objetivo. A emenda é de R$ 300 mil (cerca de 167 mil USD) para 2010. Certamente a deputada não sabia que em 2006, o projeto da escola foi orçado em quase R$ 4 milhões (cerca de 2,3 milhões de USD ).
A deputada federal Rita Camata que trocou de Partido nos últimos meses e, por isso, está sujeita à perda de mandato, está tentando aprovar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que garanta que a pessoa com deficiência não tenha idade para ser inserida no sistema educacional nacional. Talvez ela desconheça que além do papel da EJA - Educação de Jovens e Adultos, há outras leis que respaldam o assunto em foco. Mais estranho ainda é a Deputada querer fazer com que este assunto redundante ganhe status de PEC. Esperamos não haja nenhum vício a ser escondido por trás desta estratégia, no mínimo esdrúxula.
É claro que devemos elogiar as boas leis e lutar para que estas sejam preservadas. Também devemos lutar pela sua regulamentação. No entanto, mão basta comemorá-las. É necessário que saiam do papel rumo à concretização de políticas públicas sociais. Somente assim as pessoas com deciência poderão exercer a sua cidadania em todos os sentidos.
Finalmente, deve-se frisar que nenhuma liderança constituída, seja pelos três Poderes Republicanos da Nação, quanto pela investidura da presidência de uma ONG (Organização Não-Governamental), não importando o seu porte, nem tampouco, quantos votos obteve para chegar onde chegou, tem o direito de criar qualquer lei ou instrumento para deleite próprio em detrimento dos interesses daqueles que lhe deram votos.
Todo resultado imediatista tem efeito curto, muitas vezes, bem menor do que o alívio provocado por algum analgésico na hora de uma dor inspuportável.
Precisamos investir em direitos sociais que tenham como princípio fundamental, a concessão do apoio assistivo, alternativa contrária ao assistencialismo. O apoio assistivo é um contrato social entre o Estado e o indivíduo que, ao mesmo tempo, permite ao beneficiário degustar o peixe, mas também o estimula a pescar o peixe do qual se alimenta. Isto é, a se sentir insentivado a buscar energias próprias para garantir a consecução do seu amanhã feliz.
Este é o lema: Busca de calor humano, sempre; dependência extrema, jamais.
Só deveria exercer cargos públicos quem tem espírito coletivo, alma republicana e mente solidária, voltada para causas e não para coisas.
O sucesso das nossas leis depende da participação das pessoas com deficiência como protagonistas de sua própria causa, cabendo ao Estado com todos os seus instrumentos, servir de suporte, não de guia. E, essa verdade os libertará para a formação de cidadãos autônomos e indepedentes, conquistando o seu próprio espaço, fundamentados pelos princípios da produtividade e da felicidade, para as quais todos os homens nascem vocacionados, bastando proporcionar-lhes igualdade em oportunidades e adequaçao de condições.
Antônio Leitão
O cego de visão